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Descoberto o local de nascimento do Sol na Via Láctea
2018 setembro 14

Simulação da Via Láctea vista de cima, com indicação dos locais de nascimento das estrelas deste estudo.O Sol, observado pela sonda Solar Dynamics Observatory (SDO), da NASA.
Uma equipa internacional1, que inclui o investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA2) Vardan Adibekyan, descobriu uma maneira de estimar os locais de nascimento das estrelas na nossa galáxia, a Via Láctea. O artigo3 foi publicado hoje na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

A equipa usou uma amostra de cerca de 600 estrelas na vizinhança solar, observadas com o espectrógrafo de alta resolução HARPS4, montado no telescópio de 3,6 metros do ESO, no observatório de La Silla (Chile). Graças à caracterização muito precisa da massa e da metalicidade5 destas estrelas, em grande parte já anteriormente efetuada por investigadores do IA nas estrelas onde se sabe existirem exoplanetas, a equipa descobriu que as estrelas nasceram espalhadas por todo o disco galáctico, com as mais antigas a migrarem das zonas mais interiores do disco.

Vardan Adibekyan (IA & Universidade do Porto) comenta: "Esta interessante técnica é única, porque nos permitiu determinar o local de nascimento do nosso Sol. Descobrimos que a nossa estrela pode não ter vagueado pela galáxia tanto quanto pensávamos até agora, e que a distância ao centro da galáxia onde nasceu pode ser semelhante à que tem atualmente."

Há muito tempo que se sabe que as estrelas nos discos galácticos se afastam do local onde nasceram, um fenómeno conhecido como "migração radial". Este movimento ao longo do diâmetro da galáxia dificulta o estudo da história de formação da Via Láctea, pois a migração radial é afetada por diversos parâmetros, dos quais se tem pouca informação. Por exemplo, o tamanho e a velocidade da barra no centro da galáxia, o número e forma exata dos braços em espiral, ou a frequência com que pequenas galáxias colidiram com a Via Láctea nos últimos 10 mil milhões de anos.

Para contornar estes obstáculos, a equipa desenvolveu um método para recuperar a história de migração das estrelas, ao usar as idades e composição química das estrelas como artefactos arqueológicos. Isto foi possível porque a taxa de formação de estrelas aumenta do interior para o exterior do disco, com a abundância de determinados elementos a ser fortemente influenciada pela distância da estrela ao centro da galáxia. Assim, sabendo a composição da estrela com precisão, é possível determinar o seu local de nascimento sem ter de recorrer a modelos complexos, nos quais é preciso assumir valores para os outros parâmetros.

Ivan Minchev, do Leibniz Institute for Astrophysics Potsdam (AIP) e o primeiro autor do artigo, comenta: "Depois de sabermos onde é que as estrelas nasceram, podemos obter uma imensidão de informação preciosa acerca do passado da Via Láctea, mesmo só a partir do diminuto número de estrelas para as quais, neste momento, temos dados com precisão suficiente."

F. Anders, um dos co-autores, acrescenta ainda que: "No futuro, este método pode ser aplicado a medições de alta qualidade da missão da Agência Espacial Europeia (ESA) GAIA, que em conjunto com pesquisas espectroscópicas levadas a cabo em telescópios à superfície da Terra, permitirão um cálculo muito detalhado da história migratória das estrelas, e do passado da Via Láctea."


Notas
  1. A equipa é composta por I. Minchev (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); F. Anders (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); A. Recio-Blanco (Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul); C. Chiappini Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); P. de Laverny (Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul); A. Queiroz (Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Laboratório Interinstitucional de e-Astronomia - LineA,  Universidade do Porto); M. Steinmetz (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); V. Adibekyan (Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e Universidade do Porto); I. Carrillo (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); G Cescutti (Sydney Institute for Astronomy, School of Physics); G. Guiglion (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); M. Hayden (Dep. of Astronomy, University of Virginia); R. S. de Jong (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); G. Kordopatis (Instituto de Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul); S. R. Majewski (Astrophysics Research Institute, Liverpool John Moores University); M. Martig (Leibniz-Institut für Astrophysik Potsdam (AIP)); B. X. Santiago (Laboratório Interinstitucional de e-Astronomia - LineA).
  2. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a maior unidade de investigação na área das Ciências do Espaço em Portugal, integrando investigadores da Universidade do Porto e da Universidade de Lisboa, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) encomendou à European Science Foundation (ESF). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (UID/FIS/04434/2013), POPH/FSE e FEDER através do COMPETE 2020.
  3. O artigo “Estimating stellar birth radii and the time evolution of the Milky Way’s ISM metallicity gradient” foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (DOI: 10.1093/mnras/sty2033).
  4. O HARPS (High Accuracy Radial velocity Planet Searcher, ou pesquisador de planetas de alta resolução por velocidades radiais) é um espectrógrafo de alta resolução, instalado no telescópio ESO de 3,6 metros do observatório de La Silla (Chile). Deteta variações de velocidade inferiores a 4 km/h (ou aproximadamente a velocidade de uma pessoa a caminhar).
  5. Em astronomia, os elementos que não são hidrogénio e hélio são vulgarmente designados “metais”. A metalicidade de uma estrela refere-se à quantidade de "metais" que existem na sua composição.



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