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Gémea do Sol ajuda a compreender o ciclo solar e o seu efeito no clima da Terra
2018 janeiro 08

Imagem do Sol na banda do visível, colorida artificialmente, obtido pelo Solar Dynamics Observatory (SDO) durante o último máximo do seu ciclo de 11 anos. Além das manchas solares pode ver-se, em especial em volta das manchas e na orla do Sol, zonas mais claras denominadas fáculas. Crédito: SDO/NASA.
Uma equipa internacional1, que inclui vários investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA2), usou observações do telescópio espacial Kepler (NASA) e outros telescópios à superfície da Terra, para observar a estrela análoga ao Sol HD 173701. As observações apontam para que a diferença do ciclo de atividade entre esta estrela e o Sol é devida à diferença da metalicidade4 das duas estrelas.

Para Tiago Campante (IA e Faculdade de Ciências da Universidade do Porto): “Do mesmo modo que estudos envolvendo irmãos, ou até gémeos, têm um papel importante no campo da psicologia do desenvolvimento, estudos de estrelas análogas ao Sol permitem aos astrofísicos enquadrá-lo do ponto de vista evolutivo e da sua estrutura interna. O presente estudo da variabilidade de uma estrela análoga ao Sol vai permitir-nos melhor compreender os mecanismos físicos subjacentes ao próprio ciclo solar. Este tipo de conhecimento é extremamente valioso e pode, por exemplo, ajudar-nos a perceber de que forma o Sol afeta o clima no nosso planeta”.

A observação de manchas à superfície do Sol permitiu determinar que o Sol tem uma variabilidade na sua atividade magnética com um período de cerca de 11 anos – o ciclo solar. Este ciclo é regido pelo dínamo solar, que resulta da interação entre os campos magnéticos, a convecção e a rotação diferencial do Sol. No entanto, a física por detrás do dínamo solar ainda não é totalmente conhecida.

Para a ex-aluna de doutoramento do IA e da FCUP, Ângela Santos: “Estudar outras estrelas, especialmente aquelas que são semelhantes ao Sol, ajuda-nos a conhecer e a compreender melhor a nossa própria estrela”.

A estrela HD 173701 é uma dessas estrelas. A equipa analisou observações desta estrela, que vão desde 1978 até às mais recentes, obtidas com o telescópio espacial Kepler, para determinar que o seu ciclo é de 7,4 anos. As observações, que envolveram uma combinação de fotometria, espectroscopia e asterossismologia5, determinaram que a amplitude do ciclo desta estrela é mais do dobro que a do Sol.

Sendo a única diferença entre as duas estrelas a metalicidade, com a HD 173701 a apresentar quase o dobro dos “metais” que tem o Sol, parece indicar que a metalicidade é um fator importante na variabilidade das estrelas.

Santos, atualmente a trabalhar no Space Science Institute (SSI) em Boulder (E.U.A.), acrescenta ainda: “Através de estudos como este, que envolveu diferentes tipos de observações, componentes e técnicas, podemos obter informações detalhadas sobre as propriedades das estrelas, incluindo propriedades magnéticas. E assim compreender melhor os processos físicos que dão origem aos ciclos de atividade magnética.”

Com base em modelos físicos, a equipa adianta uma explicação com duas componentes para a diferença de comportamento entre o Sol e a HD 173701. Em primeiro lugar, os elementos mais pesados fazem com que a estrela fique mais opaca e o transporte de energia no interior da estrela muda de radiativo para convectivo, que é mais eficiente. Isto torna o dínamo mais potente, o que influencia a amplitude da variabilidade e a rotação da estrela. Em segundo lugar, esses elementos influenciam os processos que ocorrem à superfície e na atmosfera da estrela, em particular, aumentam o contraste entre as regiões mais brilhantes (denominadas fáculas) e o resto do Sol, que por sua vez aumenta a variabilidade da estrela.

Este estudo estabelece novos limites e fornece novas pistas para compreender como a irradiância solar irá evoluir com o tempo, e como isso irá afetar o clima na Terra. Há exemplos históricos de como a atividade solar afeta o clima, com é o caso do chamado mínimo de Maunder, um período de cerca de 50 anos de atividade solar mais fraca que o normal, que começou no final do séc. XVII, e que coincidiu com uma “mini época glaciar”, em especial na Europa.

NOTAS
  1. A equipa é composta por Christoffer Karoff (Dep. of Geoscience e Stellar Astrophysics Centre, Dep. of Physics and Astronomy, Aarhus University); Travis S. Metcalfe (Space Science Institute); Ângela R. G. Santos (Space Science Institute; Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e Faculdade de Ciências, Universidade do Porto; School of Physics and Astronomy, University of Birmingham); Benjamin T. Montet (Dep. of Astronomy and Astrophysics, University of Chicago); Howard Isaacson (Dep. of Astronomy, UC Berkeley); Veronika Witzke, Alexander I. Shapiro, Natalie Krivova e Sami K. Solanki (Max-Planck-Institut fur Sonnensystemforschung); Savita Mathur (Space Science Institute; Instituto de Astrofísica de Canarias; Dep. de Astrofísica, Universidad de La Laguna); Guy R. Davies e Mikkel N. Lund (School of Physics and Astronomy, University of Birmingham; Stellar Astrophysics Centre, Dep. of Physics and Astronomy, Aarhus University); Rafael A. Garcia, Allan S. Brun e David Salabert (Laboratoire AIM, CEA/DRF - CNRS - University Paris 7 Diderot); Pedro P. Avelino, Margarida S. Cunha e Tiago L. Campante (Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e Faculdade de Ciências, Universidade do Porto); Jennifer van Saders (Carnegie Observatories); Ricky Egeland (High Altitude Observatory, National Center for Atmospheric Research); William J. Chaplin (School of Physics and Astronomy, University of Birmingham; Stellar Astrophysics Centre, Dep. of Physics and Astronomy, Aarhus University); Maximilian Stritzinger (Dep. of Physics and Astronomy, Aarhus University); Mads F. Knudsen (Dep. of Geoscience, Aarhus University)
  2. Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a maior unidade de investigação na área das Ciências do Espaço em Portugal, integrando investigadores da Universidade do Porto e da Universidade de Lisboa, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente" na última avaliação que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) encomendou à European Science Foundation (ESF). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (UID/FIS/04434/2013), POPH/FSE e FEDER através do COMPETE 2020.
  3. Em astronomia, os elementos que não são hidrogénio e hélio são vulgarmente designados “metais”. A metalicidade de uma estrela refere-se à quantidade de “metais” que existem na sua composição.
  4. A Asterossismologia é o estudo do interior das estrelas, através da sua atividade sísmica medida à superfície. Em sismologia, os diferentes modos de vibração de um tremor de Terra podem ser usados para estudar o interior da Terra, de forma a obter dados acerca da composição e profundidade das diversas camadas. De uma forma semelhante, as oscilações observadas à superfície de uma estrela também podem ser usadas para inferir dados sobre a estrutura interna e composição da estrela.

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